Placar está em 3 a 1 a favor da condenação do ex-ministro da Casa Civil
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BRASÍLIA – Na sessão desta quinta-feira do 32º dia de julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski, votou pela absolvição do réu José Dirceu pelo crime de corrupção ativa. Considerado a figura central do esquema de compra de parlamentares pelo Ministério Público (MP) e pelo relator, Joaquim Barbosa, Dirceu, para Lewandowski, não tem contra si nenhuma prova objetiva que o incrimine. Para o revisor, o “Parquet”, como se refere ao “MP”, não apresentou nada além de “ilações”. Apesar do seu entendimento, em seguida, os ministros Luiz Fux e Rosa Weber pediram a condenação de Dirceu e José Genoino. Para eles, não é crível que Delúbio Soares fizesse tudo sozinho, que montasse um esquema para comprar parlamentares sem o conhecimento da cúpula petista.
Rosa Weber e Fux também pediram a condenação, assim como Lewandowski, de Delúbio Soares, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Simone Vasconcelos por corrupção ativa. Rogério Tolentino foi absolvido pelo revisor, mas condenado pelos outros ministros. Anderson Adauto e Geiza Dias foram absolvidos pelos quatro ministros que até agora votaram.
— Assento que é absolutamente impossível dissociar o apoio político do financeiro. Então, evidentemente que esse apoio financeiro veio em função de um apoio político. Então, há vários elementos aqui arrolados que me carreiam a paz necessária para também julgar procedente a acusação em relação ao réu José Genoíno.
Quanto a José Dirceu, Fux citou os encontros do réu com outros acusados, e a figura conhecida de Dirceu como articulador político.
— Em relação ao primeiro denunciado, José Dirceu, conclui que efetivamente ele é responsável pelo crime de corrupção ativa. O elemento mais tênue das provas que se têm aqui são as regras da experiência comum, no sentido de que, pelas reuniões a que compareceu, pelos depoimentos prestados, evidentemente que este denunciado figura como articulador político desse caso penal, até pela sua posição de proeminência no partido e de destaque no governo.
Ele fundamentou seu voto, ainda, em uma concepção probatória da Suprema Corte de Portugal.
— Apenas a título ilustrativo, a Suprema Corte de Portugal tem um acórdão memorável no sentido de que a prova nem sempre é direta. Nós juízes nos valemos de regras de experiência. Será que nestas condições seria possível não saber? Isso o Supremo Tribunal de Portugal afirma que pode ser considerado prova aquele juízo de referência razoável.
Rosa, para condenar Genoino e Dirceu, passou a analisar a argumentação de Delúbio, que assumiu para si toda a responsabilidade dos repasses a parlamentares:
— Com relação especificamente a Dirceu e Genoíno, digo eu, definida a responsabilidade de Delúbio pelos crimes de corrupção ativa, resta saber se os demais também teriam responsabilidade. A partir do momento que ele (Delúbio) assumiu a responsabilidade, negou o envolvimento de qualquer outra pessoa do PT. Segundo ele, por conta própria teria resolvido obter empréstimos junto às empresas de Marcos Valério. Nem Genoíno nem Dirceu saberiam do que ele estava fazendo.
— Com todo o respeito, não é possível acreditar que Delúbio sozinho teria comprometido o PT com dívidas de R$ 55 milhões e teria repassado aos partidos da base aliada. Quando os repasses foram acordados, seria então de se concluir que Delúbio seria o principal artífice dela e que ele teria de fato uma mente privilegiada - até me lembrei de um poema lindo, O homem só - mas não consigo acreditar nisso. Seria ainda ignorar que os valores repassados teriam origem remota de crime de peculato e financeiro.
Após mostrar que estava convencida da culpa dos dois réus, ela citou ainda as demais provas reunidas pelo MP que, segundo ela, se encaixaram como um quebra-cabeça:
— O restante das provas: as declarações incriminatórias de Jefferson e os vários indícios da ligação de Dirceu com Valério, ilustrado com os favores prestados à ex-esposa de Dirceu, com a viagem de Valério para a obtenção de recursos ilegais, fecha o quebra-cabeças. Para mim, existe prova, acima de qualquer dúvida razoável, de que Delúbio não pode ser responsabilizado sozinho. E considero a responsabilidade de Dirceu, devendo responder por nove crimes de corrupção ativa.
Rosa disse que também condenaria Genoino, pois precisaria colocar, com tranquilidade, a “cabeça no travesseiro à noite”:
— Acompanho o voto do relator e lembro sensibilizada e belíssima sustentação oral de Genoino. Ele mereceu tudo o que foi dito de bom em relação a ele. Mas, com a minha convicção... preciso botar minha cabeça no travesseiro à noite.
A ministra começou a ler o seu voto contextualizando o andamento do processo e as decisões já tomadas pela Corte:
— Foi reconhecido pelo plenário desta corte o repasse de vantagens indevidas a parlamentares do PL, PP, PTB. (...) Foram reconhecidos os crimes de corrupção passiva — disse ela, para depois complementar que “sem corruptor não há corrompido”.
Rosa disse, então , que acompanhava desde logo relator e revisor quanto ao núcleo publicitário, para condenar Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Simone Vasconcelos .
— O conjunto probatório a que me reporto é fundamento da minha convicção. Acompanho igualmente relator e revisor pela absolvição de Geiza Dias e Anderson Adauto.
— Quanto a Rogério Tolentino, relativamente ao qual houve divergência entre relator e revisor, peço vênia ao revisor para acompanhar o relator. Foi reconhecido por este plenário sua responsabilidade pelo crime de lavagem de dinheiro, especificamente do dinheiro que posteriormente foi repassado aos parlamentares do PP. O mesmo entendimento, a meu ver, é aqui aplicável.
Lewandowski: MP apresenta ilações
Para o revisor, o primeiro a falar nesta quinta-feira, não há provas contra Dirceu.
— São ilações que não encontram eco nos autos. Não há uma prova documental, nenhuma prova pericial que comprove tal fato, muito embora o processo tenha se arrastado por sete longos anos. O que existe são testemunhos. Muitos deles, senão a maioria, desmentidos cabalmente diante de um magistrado. Tudo aqui contra o réu se baseia em ouvir dizer, em reuniões das quais ele teria supostamente participado. Esta é a prova contra o réu José Dirceu. — disse Lewandowski.
Lewandowski usou depoimentos de testemunhas para sustentar que não há envolvimento do ex-ministro José Dirceu no caso. Ao citar o interrogatório de Roberto Jefferson, já condenado pelo plenário, o revisor disse que os dois políticos são "inimigos figadais" e que Jefferson estaria tentando "incriminar" Dirceu.
— Não afasto a possibilidade de que ele tenha participado dos eventos e nem que ele tenha sido o mentor desta trama criminosa, mas isso não encontra ressonância na prova dos autos.
O revisor também lembrou que José Dirceu confirmou em depoimento que jantou com Kátia Rabello, do Banco Rural, em Minas Gerais, mas a reunião tratou de temas "genéricos" e não de empréstimos fraudulentos.
— Assim não logrou o MP comprovar como lhe competia que tal reunião em Belo Horizonte tivesse algo ilícito. Vejam que o MP supervalorizou as palavras ditas pela mulher de Marcos Valério, que ouviu dizer alguma coisa e repetiu na fase judicial. Mais uma vez, como juiz, tenho que dar mais valor às provas.
O ministro Lewandowski afirmou que o empréstimo realizado pela ex-mulher de José Dirceu junto ao Banco Rural para a compra de um imóvel não teve a participação do ex-ministro:
— Qual é a relevância disso para o caso? O MP baseou-se num único depoimento judicial e o MP omitiu o depoimento de Ivan Guimarães que assegurou que o empréstimo para a compra do apartamento não contou com a participação de José Dirceu. A meu sentir, ficou comprovado que Maria Ângela era amiga de Sílvio Pereira e foi por ele que ela conseguiu contatar Valério para a compra do imóvel — argumentou.
Lewandowski leu diversos testemunhos de líderes partidários que negam a compra de votos durante a votação, no Congresso, da reforma previdenciária, e afirmou que a compra de votos de congressistas foi confirmada apenas pelo "depoimento isolado" de Roberto Jefferson.
— Então, digo que com relação a corrupção ativa com parlamentares do PTB, como também dos demais partidos, a denúncia não menciona qual teria sido a ação praticada pelos réus. Na peça acusatória há uma afirmação isolada e que não inclui José Dirceu. Mesmo após uma densa e demorada instrução criminal, o Parquet não demonstrou êxito ao lançar uma acusação abstrata. A verdade é que o Parquet se apegou a depoimentos contraditórios e nada atinge Dirceu de forma direta.
Ministro pergunta a revisor se Delúbio teria autonomia
Sobre a tese já confirmada pela maioria do Supremo de que houve compra de apoio político no Congresso, Lewandowski afirmou o contrário. Para ele, o mensalão não existiu:
— Corroborando as conclusões, também colho dos autos que alegada compra de votos não teria existido. Vários deputados afirmaram que nunca ouviram falar neste esquema chamado mensalão e se manifestaram no sentido contrário ao que diz o MP. Essas votações foram feitas publicamente.
Logo após a exposição da sua versão, o revisor foi interpelado pelos ministro Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Eles perguntaram se não havia uma contradição no voto de Lewandowski. O revisor condenou o tesoureiro do partido, Delúbio Soares , por corrupção ativa, e parlamentares por corrupção passiva, mas inocentou Dirceu por corrupção ativa. Marco Aurélio perguntou:
— Vossa excelência imagina que um tesoureiro de um partido político teria essa autonomia? (para comprar parlamentares)
— Ao contrário do que já foi dito, eu não acredito em Papai Noel, mas disse que é possível que eles tenham cooperado a mando de alguém, mas este alguém precisa ser identificado — respondeu Lewandowski.
— Esse alguém não estaria denunciado no processo? — voltou a perguntar Mello.
— Não, não é isso (...) Insisto que a lista de projetos de lei, data vênia, apresenta sabor lotérico da legada prática dos delitos da denuncia. Vou adiante dizendo que não há prova absoluta e digo mais: a tese da compra de votos é tão frágil como podem ser vislumbradas.
A sessão desta quinta-feira no STF começou com atraso de 40 minutos, devido à falta de luz na Asa Norte e na região central de Brasília, e está sendo realizada à base de geradores. Apagões em série afetam diversas regiões da capital federal. De acordo com a assessoria de imprensa da Companhia Energética de Brasília, o problema ocorreu na subestação Brasília Sul, que abastece a Asa Norte e a região central da cidade. Regiões como a Asa Sul e o Setor de Indústrias de Abastecimento continuam com luz. Segundo a CEB, a subestação é administrada por Furnas.
Revisor já condenou Delúbio
Os demais ministros do Supremo devem começar a votar na terça-feira.
Na quarta-feira, o revisor votou pela condenação do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, mas absolveu José Genoino, ex-presidente do partido, ao contrário do ministro relator, Joaquim Barbosa.
Em seu voto, Lewandowski chamou as acusações do MP contra Genoino de vagas, lacônicas e kafkianas. E comparou a situação do réu a do personagem do livro “O Processo”, de Franz Kafka, que precisa se defender judicialmente de algo que não sabe o que é:
— Mesmo depois de encerrada instrução criminal, na qual se produziu um volume impressionante de elementos de convicção, o Ministério Público não conseguiu nem de longe apontar de forma concreta os ilícitos que teriam sido praticados por José Genoino.
Lewandowski também divergiu de Barbosa em relação ao advogado Rogério Tolentino, ligado a Marcos Valério. O relator condenou o réu, e o revisor o absolveu. Os ministros concordaram ao condenar Marcos Valério, seus ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach e a ex-diretora financeira da SMP&B Simone Vasconcelos. Eles também concordaram em absolver a ex-gerente da SMP&B Geiza Dias e o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto.
Barbosa condenou Delúbio porque era dele o papel de apontar para Valério os beneficiados dos pagamentos. Genoino, por sua vez, assinou empréstimos fictícios contraídos no Banco Rural para alimentar o valerioduto.
Ao absolver Genoino, Lewandowski afirmou que seus atos teriam se limitado a reunir-se com líderes partidários para falar de finanças e de alianças políticas. O ministro ressaltou que a prática não configura crime. O presidente do STF, Ayres Britto, chegou a ponderar que é preciso ver em que situação essas reuniões ocorreram. O revisor insistiu que não havia prova de ilícitos, provocando a ironia de Marco Aurélio Mello:
— O senhor está me convencendo de que o PT não fez qualquer repasse a parlamentares.
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