A segurança pública no Pará vai de mal a pior, mas a Polícia Militar não tem motivo para reclamar. Ela acaba de alugar, pelos próximos dois anos, 450 carros de passeio, novinhos em folha, ao preço de R$ 20 milhões, para rodar pelas ruas de cinco cidades do Estado na perseguição aos bandidos. A diária de cada veículo, nos próximos 730 dias, custará R$ 62,00 aos cofres públicos. Todos os carros são equipados com rádiotransmissor para comunicação entre os policiais. Os carros da marca Fiat Palio irão reforçar o policiamento nas ruas das cidades de Belém, Marabá, Castanhal, Santarém e Ananindeua.
Um detalhe no mínimo intrigante, no entanto, chama a atenção nesse contrato: fora as despesas com manutenção dos carros, ao final desses dois anos, a empresa locadora terá cedido 900 carros para honrar um contrato de R$ 20 milhões com o governo de Ana Júlia Carepa. Com a diária a R$ 62, se ela fosse alugar os veículos para outro governo iria faturar mais R$ 20 milhões. É que o contrato assinado entre as partes estabelece, dentro de um ano, a troca dos 450 veículos usados nas ruas por outros 450 inteiramente novos. Prejuízo à vista? A empresa parece não estar preocupada com isso. O segredo do negócio está no fato de que ela pretende ter lucro, no final do contrato, com a venda dos carros aos próprios policiais militares.
Outro aspecto estranho do contrato é a opção por veículos modelo Palio, que dispõem de reduzido espaço interno - para transporte de presos, por exemplo - e baixíssima potência nos motores 1.0 (modelo popular). O mais surpreendente é que investimento tão vultoso não contemple veículos maiores e apropriados para ações de natureza policial, como ocorre em outras capitais. Fortaleza (CE), por exemplo, é policiada por espaçosas caminhonetes Hylux, da Toyota. O próprio governo do Pará, recentemente, adquiriu uma frota de picapes Frontier, da Nissan, mais adequadas às atividades da Polícia.
Experiente oficial da Polícia Militar, que não quis se identificar, observa ainda um outro aspecto intrigante: a ausência de motoristas habilitados na corporação para conduzir esses 450 veículos. “Um outro absurdo desse negócio é a parte do combustível. Todo mundo sabe que a Polícia Militar vive com problemas para abastecer seus carros em todo o Estado, sempre falta combustível. Onde irá se arranjar verba para combustível de 450 carros de uma só vez, além da frota já existente?”, questiona.
Acrescenta que, dentro da corporação, o comentário que circula é que os carros servirão apenas “de enfeite”, circulando pelas ruas centrais das maiores cidades, com objetivos claramente marqueteiros, mas sem qualquer utilidade prática na luta contra a criminalidade urbana. “O Palio não tem bagageiro para transportar presos e não tem força de motor para perseguir bandidos nas ruas, nem que estejam andando de bicicleta. Esse contrato parece uma piada de mau gosto porque não vai diminuir nenhum índice de violência no Estado”, argumenta o militar.
A empresa que alugou os veículos é a Delta Construções S/A, pertencente a um dos novos ricos do país, o empresário Fernando Cavendish, que abocanhou as mais importantes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em vários Estados, mas sem qualquer tradição ou experiência em locação de carros. Curiosamente, o governo do Estado dispensou empresas conceituadas nesse segmento, preferindo prestigiar a construtora mais aquinhoada com obras da administração petista.
O empresário Fernando Cavendish também é o financiador de campanhas eleitorais do PT, do PMDB e PSDB. Portanto, ele sabe muito bem onde enfia os pregos de suas obras. Embora em muitas delas, com as quais já faturou mais de R$ 3 bilhões, esteja metido em inúmeras trapalhadas. Em Belém, Cavendish construiu o elevado da Júlio César com a Pedro Álvares Cabral e toca as obras da avenida Independência. Seus negócios com o governo de Ana Júlia já superam mais de R$ 50 milhões, excluindo os R$ 20 milhões do aluguel de veículos à PM. Também participa da recuperação de um trecho da rodovia PA-150, entre Goianésia, Marabá e Eldorado dos Carajás.
Um outro negócio de destaque entre a Delta e o atual governo diz respeito à Secretaria de Estado de Transportes, que pagou R$ 10 milhões por um contrato - denunciado pela Auditoria Geral do Estado e noticiado pelo DIÁRIO - baseado em licitação que já havia sido revogada. Além disso, um trecho da obra (entre Xinguara e Redenção), pago no governo anterior, foi novamente quitado no início da administração Ana Júlia, que pagou duas vezes por uma obra de quase R$ 10 milhões.
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