RIO, BRASÍLIA e SÃO PAULO - Os Tribunais de Justiça (TJs) resistem à
divulgação dos salários individualizados de magistrados e servidores em
todo o Brasil, como prevê o regulamento da Lei de Acesso. Em reunião do
Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça, na
quarta-feira, os 24 presidentes regionais se declararam contrários à
resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que estabelece o dia de
hoje como data-limite para a publicação dos nomes, salários, abonos e
gratificações do Judiciário. O Tribunal de Justiça do Paraná afirmou que
não vai respeitar a determinação do conselho. No Rio, liminar pedida
pela Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj)
conseguiu na Justiça Federal a suspensão da divulgação dos nomes.
Nesta quinta-feira, o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, desembargador Manoel Alberto Rebêlo dos Santos, divulga uma
carta aberta com críticas ao decreto que garantiu a publicação dos
dados. Ontem, o magistrado chegou a comparar o decreto que normatizou a
divulgação dos nomes e salários a um ato institucional, aos moldes do
regime militar.
— (Ao) Publicar indistintamente (os nomes), você
está violando um direito garantido pela Constituição Federal. A partir
do momento que não se obedece ao que a Constituição determina, estamos,
ao meu ver, correndo um risco muito grande. Daqui a pouco, estaremos
sendo governados por decretos aos moldes da época dos atos
institucionais. Não podemos superar o que está determinado na
Constituição — compara Rebêlo.
Queixas ao ministro Ayres Britto
Apesar
de negarem oficialmente o encontro, na última quarta-feira os
presidentes dos Tribunais de Justiça se reuniram com o presidente do CNJ
e também do STF, ministro Ayres Britto, e demonstraram insatisfação com
a decisão. Segundo o presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas
(TJ-AM), Ari Jorge Moutinho da Costa, Britto estava determinado a fazer
cumprir o prazo estabelecido pelo CNJ.
— Na reunião com Ayres Britto, ele deixou claro que não irá postegar a publicidade dos salários — afirmou Moutinho.
Já
Marcus Faver, presidente do Colégio Permanente de Presidentes de
Tribunais de Justiça, disse que o tema não chegou a ser abordado na
reunião com Britto. Segundo ele, ficou apenas no colegiado. Faver não é
favorável à divulgação da lista nominal com os salários:
— O
importante para a sociedade é saber exatamente quanto é o salário dos
servidores. Quem é o titular, você pode dar isso pelo número de
matrícula. O resto é, a meu ver, uma curiosidade mórbida. Mas acho que
os tribunais vão cumprir o que o Supremo determinou, embora questionando
isso.
Para o ex-presidente da Associação dos Magistrados do
Brasil (AMB) Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, a Lei de Acesso não
determina a divulgação dos nomes. Para ele, um decreto não pode se
sobrepor à Constituição:
— Gera uma perplexidade jurídica absoluta
que um decreto possa determinar o que nem a Constituição e nem a lei
autorizam. Fica um poder muito grande na mão do Executivo. Isso é um
totalitarismo. É como se um Fujimori ou Hugo Chávez tivessem incorporado
em alguém e tivessem colocado no decreto algo que a lei não autorizava.
A Amaerj pode levar o caso ao STF:
—
Entramos com uma medida precária para suspender esta arbitrariedade.
Estamos preparados para levar este caso até Brasília. O decreto fere a
Constituição e cabe ao Supremo avaliar a validade dessa determinação —
explica o presidente da Amaerj, desembargador Claudio dell'Orto.
Apesar
de todos os TJs estarem contra a publicação, apenas o do Paraná afirmou
que vai descumprir a determinação do CNJ e manterá as informações em
segredo. A medida vale, pelo menos, até a próxima segunda-feira, quando a
Corte Especial do TJ-PR tem reunião agendada e avaliará o caso.
Em
junho, o Órgão Especial do TJ paranaense já havia considerado
inconstitucional a publicação de nomes, cargos e salários de servidores
em julgamento de ação direta de inconstitucionalidade contra lei
estadual que determinava a publicação dos dados. Os desembargadores
consideraram que a exposição viola o direito à privacidade dos
servidores.
O Tribunal de Justiça de São Paulo informou que irá
cumprir o prazo e divulgar, nominalmente, a folha de pagamento dos
servidores. A medida também será seguida por Pernambuco.
Em Santa
Catarina, o TJ informou que vai cumprir a determinação do CNJ, mas que
por força de uma liminar não teve tempo para normatizar o sistema. A
previsão é que os dados estejam disponíveis na próxima semana.
Favorável
à divulgação dos nomes na folha de pagamento, o presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) em São Paulo, Marcos da Costa, avalia que a
resolução representa um avanço na transparência do Judiciário.
— É
um direito do contribuinte saber a aplicação de cada centavo do
dinheiro público para qualquer que seja a sua finalidade, tanto em
contratos, licitações ou obras como em salários de quaisquer
funcionários públicos — afirma Marcos da Costa.
Fonte: http://oglobo.globo.com