Dois candidatos classificados no concurso público para admissão ao Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Pará denunciaram à reportagem do Diário Online a existência de supostas irregularidades, ocorridas na prova realizada em 18 de abril deste ano, pela Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp).
De acordo com os denunciantes, uma falha no enunciado da redação teria induzido os candidatos ao erro. O comando apontava uma autoapresentação assinada pelo autor como texto-base, ou seja, sugeria ao candidato que escrevesse um texto descritivo sobre sua pessoa, assinalado ao final. (Veja a redação na íntegra clicando na imagem ao lado)
No entanto, consta na grade de correção prevista pelo edital do concurso que é proibida qualquer menção que possa identificar o candidato. A identificação da prova implica em atribuição da nota zero, e automaticamente, a eliminação do concurso.
Teoricamente induzidas pelo enunciado da prova, algumas pessoas assinaram suas redações, mas não tiveram sua pontuação zerada e permaneceram concorrendo às vagas, mesmo sob a hipótese de terem sido identificados durante a correção, fato que poderia dar margem a favorecimentos.
Vários candidatos se sentiram prejudicados e entraram com recurso administrativo na Fadesp, relatando justamente o tema confuso da prova e a contradição no resultado. Entretanto tiveram seus pedidos de revisão indeferidos.
Identificando estas irregularidades, alguns candidatos procuraram o Ministério Público do Estado (MPE), que por meio do promotor Marcelo Batista Gonçalves, da Promotoria de Justiça de Direitos Constitucionais e do Patrimônio Público, iniciou um processo de apuração da existência das falhas que comprometiam a validade do concurso.
INVESTIGAÇÃO
No dia 5 de maio o MPE enviou um ofício solicitando ao presidente da comissão do concurso da PM, coronel José Osmar Rocha Neto, que enviasse esclarecimentos dentro de um prazo de 15 dias. O Ministério alegou que o tema da redação, por si só, feria o princípio constitucional da impessoalidade, pois pedia ao candidato um autoretrato, o que facilitaria uma identificação. (Veja o ofício do MPE na íntegra clicando na imagem ao lado)
Um candidato que fez prova no IEEP (Instituto de Educação Estadual do Pará), declarou ao MPE que ficou surpresa ao saber da aprovação no concurso, com 16 pontos, mesmo tendo assinado a redação. Este mesmo candidato tomou conhecimento de que outras pessoas que se identificaram, também tinham sido aprovadas.
Passados 22 dias, a comissão do concurso não enviou nenhuma resposta ao MPE, que por sua vez voltou a contatar a PM, agora enviando um ofício para o coronel Augusto Emanuel Leitão, comandante geral da Polícia Militar do Pará, solicitando novamente esclarecimentos.
A falta de retorno por parte da comissão do concurso poderia render a PM um processo de improbidade administrativa e desobediência ao Ministério Público. Então, no dia 18 de junho, exatamente dois meses depois da realização da prova, a comissão da PM informou que estaria encaminhado o pedido de revisão das supostas falhas à coordenadora do setor de cursos e concursos da Fadesp, Leila Selma Lamarão.
RESPOSTA
Em documento oficial, a Fadesp descartou as possibilidades de erros na elaboração do enunciado da redação. De acordo com a Fundação, a proposta era elaborar um texto onde o candidato deveria “se apresentar, em uma espécie de autoretrato que revelasse seu jeito de ser”, descrevendo “as razões que os levaram a querer fazer parte da Polícia Militar”. A coordenadora do concurso alegou que o candidato foi orientado no comando da prova que o texto-base para a redação deveria servir apenas como inspiração, e “os candidatos não precisavam, ao construir seus textos, ter nenhum compromisso com a verdade.
Também destacou que a banca avaliativa somente levou em consideração a competência textual das redações. Já sobre as assinaturas que identificaram as provas, a Fadesp apenas afirmou que seus formulários de redação foram desidentificados pelos fiscais das provas, na presença dos candidatos, e que os professores da banca não tiveram acesso aos nomes.
O MPE considerou que a Fadesp não prestou os devidos esclarecimentos, diante da declaração de candidatos que foram aprovados mesmo identificando suas provas, o que levantou suspeitas quanto a transparência e a imparcialidade do concurso.
Novas explicações foram solicitadas à Fundação, além de uma cópia da prova de um candidato que declarou ter identificado a prova e não foi eliminado.Segundo os candidatos que fizeram a denúncia, a Fadesp teria enviado ao MPE uma cópia fraudada desta prova, com a assinatura coberta.
SEM SOLUÇÃO
O promotor Marcelo Gonçalves, que está cuidando do caso, enviou no final do mês de julho, uma carta de recomendação à fundação regente do concurso, pedindo a revisão das provas num prazo máximo de 15 dias, para que fossem atribuídas notas zero às pessoas que identificaram suas redações, e afirmando que se a fraude for comprovada, o concurso deve ser invalidado.
Foi informado à reportagem que até o momento a Fadesp não enviou respostas e as providências recomendadas não foram tomadas.