Você não sabe, mas o caminhoneiro que viaja na estrada ao seu lado cheirou cocaína e comprou droga no cartão de crédito. A Polícia Rodoviária Federal não fiscalizou nada. Quando "fiscaliza", finge e pede dinheiro. É denúncia. O Fantástico mostrou no domingo (27) com exclusividade. A reportagem derrubou o coordenador nacional da Polícia Rodoviária Federal. Todas as autoridades se mostraram indignadas depois que as imagens foram ao ar. O coordenador nacional de operações da Polícia Rodoviária Federal foi exonerado. O repórter Maurício Ferraz mostra em detalhes esse escândalo nas rodovias brasileiras, começando com uma denúncia chocante: drogas vendidas abertamente em postos de combustível e pagas com cartão de crédito. É uma viagem de dez mil quilômetros em uma boleia de caminhão. Passamos por 11 estados. Geralmente quem nos oferece drogas são os funcionários dos postos de combustíveis. Em um deles, na BR-101, em Itajaí (SC), o frentista oferece cocaína ao nosso produtor logo que paramos para abastecer O frentista diz que, depois do serviço, vai se encontrar com traficantes e que três caminhoneiros já encomendaram a droga. Nosso produtor simula interesse. O frentista ficou de trazer a cocaína para outro posto. Nós não compramos a droga. A gente só quer saber se ele vai cumprir com o combinado. À meia-noite, o frentista aparece, como havia prometido. Ele não encontra nosso produtor e vai embora. Em Itajaí, fica um dos maiores portos do país, o que explica a grande quantidade de caminhoneiros na região. Fomos a outro posto de combustível, ainda na BR-101. A informação é que os frentistas oferecem cocaína para os caminhoneiros. Nós fizemos um teste para ver se realmente essa informação é verdadeira. Nosso caminhão encosta próximo a uma bomba de combustível, como se fosse abastecer, e mais uma vez um frentista oferece cocaína sem nenhum receio. Quando já íamos embora, uma surpresa: o frentista diz que a droga pode ser paga com cartão de crédito. No outro dia bem cedo, voltamos ao posto e encontramos o mesmo frentista. Segundo ele, a venda de cocaína acontece durante 24 horas. Em Uruguaiana, cidade gaúcha, fica o maior porto seco da América Latina. No imenso terminal de cargas, há caminhoneiros de todo o Brasil. Por lá também ha muita droga. Durante os 20 dias que passamos na estrada, encontramos venda de drogas nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Alagoas. Além da cocaína, flagramos também muita venda de crack. “Há muito tempo era maconha. Do ano passado para cá, nós detectemos que a primeira droga a ser utilizada é justamente a cocaína”, afirma o toxicologista Anthony Wong. Em um posto, a venda de drogas é feita ao lado de várias crianças. Na BR-116, em Cajati (SP), caminhoneiros também conseguem comprar crack bem ao lado de uma delegacia. “É a lei da sobrevivência. Os horários e as premiações fornecidas pelas empresas que contratam os caminhoneiros estão obrigando eles a recorrer a esses entorpecentes para poder cumprir esses compromissos”, alega Diumar Bueno, presidente da Federação Nacional dos Caminhoneiros Autônomos. Na viagem, pegamos carona com o caminhoneiro Nilton Clemente Mina. Há 28 anos na estrada, ele diz que nunca precisou usar drogas e também não se envolveu em nenhum tipo de acidente. “Não adianta botar muita pressão demais e aí depois não aguenta. Aí acontecem os acidentes. Tem que ter o repouso também, não é só dirigir. Tem que ter a horinha de repouso. De 100 ou 200 quilômetros, dá uma paradinha para dar uma relaxada e depois continua de novo. A noite é para dormir, como diz o outro”, comentou o caminhoneiro Nilton Clemente Mina. Flagrantes de abandono e corrupção nas estradas brasileiras Em Natal, Rio Grande do Norte, quase todos os dias a Policia Rodoviária estadual realiza operações na via costeira. Mas um policial não está ali só para fiscalizar os motoristas. Foi o que comprovamos neste mês durante a viagem que fizemos pelas estradas no Brasil. O carro da nossa equipe é parado. Sem saber que se travava de uma reportagem, o policial diz que vai multar nosso veículo por causa dos vidros escuros. O policial pede ao nosso motorista que o acompanhe. Dentro do posto, em uma sala fechada, ocorre o pedido de propina. Ele põe o dinheiro no bolso. No Ceará, para mais de 30 policiais o superintendente do estado fala de um deputado federal que teve o carro apreendido e ficou furioso. Ele não revela o nome do político. “Isso vai repercutir lá dentro do Congresso Nacional, com o cidadão que tem direito a voz no Parlamento”, disse. Ubiratan Roberto de Paula pede aos colegas que pensem duas vezes antes de multar políticos e empresários, chamados de “parceiros”. “Um parceiro. O que é isso? Você ter uma tolerância. Eu estou pedindo para vocês tolerarem uma pessoa inabilitada? Eu não estou pedindo, mas que vocês usem o bom senso”, disse. Procuramos Ubiratan de Paula na quarta-feira passada (23). No mesmo dia, ele pediu demissão do cargo. Em nota, alegou motivo de saúde e disse que jamais solicitou a qualquer policial que não aplicasse multa. Outro vídeo polêmico mostrado pelo Fantástico: Alvares Simões, coordenador geral de operações da Polícia Rodoviária Federal, fala em uma reunião só com policiais em novembro passado. Entre os assuntos, o envio de policiais rodoviários para ajudar no combate aos ataques criminosos no Rio de Janeiro, ocorridos naquele mês. “A gente vive da política também. A gente vive dessa imagem, dessa imagem que, quem é especialista sabe, não resolve. O que resolve é a coisa paulatina, todo dia. Mas, para dar uma resposta à opinião pública, tem que fazer a firula. Então, estamos lá fazendo a firula com todo mundo”, afirmou. Procurado pela nossa equipe de reportagem, o coordenador geral deu a seguinte explicação: “Firula é um jargão nosso, um jargão interno, que diz respeito a uma atividade diferenciada com maior número de efetivo, que tem como objetivo mostrar uma presença maior para que a sociedade sinta essa percepção de estar segura”. Assim que viu as declarações, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, determinou a exoneração do coordenador nacional de operações da Polícia Rodoviária Federal. “A postura que foi aqui vista das autoridades que dirigem este órgão é realmente inaceitável. Eu posso afirmar que o Ministério da Justiça agirá com rigor nesse fato”, afirmou. Nova denúncia: em Alagoas, três postos da Polícia Rodoviária Federal passaram por reformas. As obras custaram pouco mais de R$ 1 milhão. Um deles é o que fica na cidade de São Sebastião (AL). A rodovia está sendo duplicada e o posto está no meio do caminho. De acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), em outubro de 2009 foi feita uma audiência pública sobre a duplicação da estrada e por onde ela passaria. Mesmo assim, quatro meses depois, em fevereiro de 2010, o posto começou a ser reformado pela Polícia Rodoviária Federal. Moradores da região acreditam que o posto terá de ser demolido. “Por que não viram isso antes, em vez de gastar tanto dinheiro à toa, dinheiro do povo?”, indagou a dona de casa Marinalva Silva. Gibson Viana, superintendente da Polícia Rodoviária Federal em Alagoas, disse que o posto continua de pé. “Não haverá, no nosso entendimento e devidamente confirmada pelo DNIT, qualquer transtorno tanto de ordem operacional quanto de ordem financeira e de ordem física com relação ao nosso posto”, garantiu. Em nota, o DNIT disse que o projeto original previa a demolição, mas que os engenheiros encontraram erros e que agora o projeto está em analise. Para o Sindicato dos Policiais Rodoviários, se o posto não for desmanchado vai precisar de mais uma reforma. É que o prédio ficara com a frente só para uma pista. “O próprio departamento informa os modelos de postos referente a cada tipo de pista. Aquele não é o modelo de posto adequado para pista dupla”, aponta Tácio Melo da Silveira, presidente do Sindicato da Polícia Rodoviária Federal em Alagoas. De volta para a estrada também flagramos veículos apreendidos nessa situação. Muitos carros estão no pátio da Policia Rodoviária Federal há mais de dez anos. Estão tão destruídos que é até difícil identificar o modelo de alguns. Durante os 20 dias que percorremos as rodovias federais, passamos por mais de 70 postos de fiscalização. Três estavam completamente abandonados, sem ninguém trabalhando. Em dez mil quilômetros de viagem, fomos parados uma única vez, e o policial nem perguntou se o caminhão estava ou não carregado.
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